Cinema, Crítica de Filme

A Natureza das Coisas Invisíveis | Crítica

Luto, crescimento e afeto em uma história simples, humana e profundamente verdadeira.

Existem filmes que falam sobre temas grandes sem levantar a voz, encontrando força no sutil. A Natureza das Coisas Invisíveis é exatamente esse tipo de obra: uma história que enxerga o mundo pelos olhos de duas crianças, mas sem ignorar as dores, contradições e responsabilidades do universo adulto que as cerca. Dirigido com sensibilidade e precisão, o longa se apoia em um olhar atento e realista para o cotidiano, transformando pequenas experiências em sentimentos universais.

O primeiro acerto do filme está no trabalho das jovens atrizes Laura Brandão e Serena. Elas compreendem algo raro: a infância carrega doçura, imaginação e espontaneidade, mas também medo, perda e silêncio. Suas interpretações capturam esse estado intermediário com naturalidade, construindo uma amizade e uma jornada emocional que nunca soam forçadas. O luto, por exemplo, surge como uma presença constante, não como um monstro, mas como algo que existe, que precisa ser olhado e digerido por quem ainda está aprendendo a entender o mundo.

Ao mesmo tempo, o filme não limita sua narrativa ao ponto de vista infantil. As duas mães interpretadas por Larissa Mauro e Camila Márdila também carregam suas próprias dores, pressões e hesitações. Elas trabalham, se desgastam, se frustram e tentam oferecer amor e estabilidade enquanto lidam com seus próprios vazios. O roteiro é inteligente ao construir esses dois níveis narrativos: o adulto e o infantil, ambos atravessando as mesmas situações, mas percebendo-as de formas diferentes. Em muitos momentos, o longa mostra como os mesmos acontecimentos podem ser pesados, tristes ou assustadores para os adultos, enquanto para as crianças eles ainda mantêm um brilho, uma ignorância necessária, uma capacidade de continuar respirando apesar das perdas.

Essa dualidade é o coração do filme. Mesmo quando aborda temas difíceis, ele nunca abandona a doçura, e não o faz por fuga, mas por compreensão. Crianças não deixam de ser crianças só porque o mundo fica pesado. Elas brincam, observam, perguntam, interpretam o que conseguem e continuam crescendo. O filme entende esse movimento e o retrata com simplicidade e maturidade.

A narrativa é linear, pé no chão e muito segura. Não há necessidade de grandes elipses, reviravoltas dramáticas ou marcações de tempo. O filme quer que acompanhemos o viver, não o enredo pelo enredo, mas os passos, os pequenos acontecimentos e o modo como eles moldam os personagens. Essa escolha dá ao longa uma empatia muito fácil: o público reconhece aquelas rotinas, aquelas conversas, aqueles desconfortos e pequenos silêncios que dizem tanto sem precisar ser explicados.

Há também espaço para a cultura local de Goiás, que aparece como textura, ambiente e memória. É bonito perceber como tradições, festas e hábitos entram em cena com naturalidade, reforçando que cada personagem não é só indivíduo, mas parte de uma região, de uma criação, de uma vida coletiva. Talvez o filme pudesse aprofundar um pouco mais os motivos e significados dessas tradições para as personagens, mas mesmo sem essa explicação mais direta tudo funciona bem, está ali, pulsando dentro da narrativa como parte orgânica daquele mundo.

Ao final, A Natureza das Coisas Invisíveis se mostra um filme de camadas: fala de luto, de crescimento, de responsabilidade, mas também de delicadeza, adaptação e descoberta. É sobre adultos que ainda não sabem tudo e crianças que já entendem mais do que parecem.

Nota: 5/5

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