Cinema, Crítica de Filme

Ruídos | Crítica

O terror que faz do som seu maior aliado e inimigo.

O terror Ruídos, dirigido por Kim Soo-jin, parte de uma premissa que parece simples, mas rapidamente revela camadas de sensibilidade e tensão muito além do susto fácil. Sua protagonista, uma jovem surda que usa aparelhos auditivos, é o coração da narrativa e também o filtro pelo qual o espectador é convidado a sentir o mundo. A partir dessa condição, o filme constrói uma ambientação sonora milimetricamente calculada, alternando entre o silêncio opressivo e o ruído ensurdecedor, para nos colocar na mesma posição de vulnerabilidade da personagem. É um conceito que lembra o domínio técnico de Um Lugar Silencioso, mas aqui com uma pegada mais introspectiva e emocional.

A trama começa com o desaparecimento da irmã da protagonista, evento que desencadeia uma investigação pessoal dentro de um prédio cheio de segredos e vizinhos que escondem mais do que aparentam. O espaço físico do edifício é explorado de forma quase labiríntica, corredores estreitos, portas entreabertas, ruídos que vêm de todos os lados e nunca se revelam completamente.

O diretor entende o poder do som como narrativa: o simples estalo de um interruptor ou o chiado do aparelho auditivo tornam-se gatilhos de suspense. Cada ruído, cada batida, carrega a dúvida entre o real e o imaginado.

É nesse primeiro ato que o filme alcança seu auge. A relação entre a protagonista e o som e, por consequência, com o medo é tratada com enorme respeito. O espectador sente o desconforto, mas também a força da personagem em enfrentar um mundo que não a ouve por completo. As cenas dentro do apartamento são especialmente bem conduzidas, com uma fotografia sombria e tons azulados que reforçam a sensação de isolamento. Há também uma inteligência em como o filme faz o som “invadir” o silêncio, criando sustos que não dependem da trilha sonora, mas do próprio espaço ao redor.

Porém, quando o roteiro começa a expandir o escopo e introduzir novas subtramas,  envolvendo os moradores do prédio e um passado misterioso, Ruídos perde parte de sua precisão. A mudança de foco é brusca e deixa para trás o que havia de mais interessante: a busca pessoal e o terror sensorial. O filme passa a revisitar lugares e ideias, como se tentasse encontrar novas ameaças onde já havia descoberto o essencial. Essa multiplicação de caminhos dilui o impacto e gera uma sensação de repetição, como se a própria estrutura começasse a ecoar seus ruídos, mas sem significado.

Ainda assim, há mérito na proposta e coragem na execução. Kim Soo-jin demonstra domínio técnico e boas intenções narrativas, mesmo quando o roteiro se perde em suas próprias voltas. O saldo final é de um terror atmosférico, inteligente e visualmente bem resolvido, mas que sofre com a falta de amarração entre suas partes. Ruídos termina como começou: cheio de sons que perturbam, mas com respostas que nunca chegam por completo, e talvez esteja justamente aí o seu verdadeiro medo.

Nota: 2/5

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