O pavor não grita, ele observa, lento, na sombra do palco, enquanto você se diverte e busca sua redenção

Pecadores (Disponível na HBO Max) é vendido como terror, mas o gênero aqui é só a porta de entrada para algo bem mais denso. O que realmente move o filme é a dor da exclusão, da injustiça e da sobrevivência. O que assombra não são apenas os fantasmas, mas o peso de uma realidade que insiste em não desaparecer.
Michael B. Jordan interpreta gêmeos com personalidades distintas, mas marcadas por uma mesma origem dolorosa. É uma performance dupla cheia de camadas, um trabalho que exige presença constante, e que Jordan entrega com domínio. Ele paira sobre o filme inteiro, e não por acaso: seus personagens são o coração, o trauma e a esperança de tudo que vemos.
O filme se passa quase todo dentro do clube de blues dos gêmeos, em sua noite de inauguração, o que por si só já cria uma atmosfera rica e carregada de simbolismo. É nesse espaço que os personagens tentam reconstruir algo, talvez uma vida, talvez só uma noite de paz. A música não é só trilha: é estrutura narrativa, usada com inteligência para construir cenas, intensificar emoções e até transformar atos inteiros da trama.

O roteiro acerta ao dar tempo para todos os personagens, não só os principais. Mesmo os secundários são bem desenhados, com histórias próprias e laços fáceis de criar com o público. Isso torna tudo mais impactante quando o elemento sobrenatural começa a ganhar corpo.
Apesar da etiqueta de “terror”, o que o filme faz é usar o gênero para falar de violência racial, de invisibilidade social e de sobrevivência negra numa época cruel. É duro e, em alguns momentos, até explícito demais, mas há um propósito claro: mostrar que o horror não está só nos cantos escuros, mas no dia a dia, nos olhares, nas portas fechadas.
A maquiagem, os efeitos práticos e visuais são impecáveis, usados sempre com função dramática e nunca como distração. E o vilão vivido por Jack O’Connell funciona não só como ameaça, mas como um reflexo do poder opressor da época: frio, persistente, inescapável.
No fim, Pecadores é menos sobre assombração e mais sobre a busca por redenção num mundo que insiste em castigar quem tenta viver com dignidade. O terror é só o que sobra depois que tudo o resto já foi retirado.
Nota: 4/5
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