Sem cortes, sem filtro: apenas o Brasil, visto de perto
No Céu da Pátria Nesse Instante é um documentário que não corre para concluir, nem tenta convencer de imediato. Ele observa. E é justamente nessa postura observadora, quase clínica, que o novo filme de Sandra Kogut se destaca em meio a tantas obras políticas que disputam narrativas: ele não tem medo de deixar o tempo correr, de manter o silêncio, de nos fazer escutar.
Registrando os bastidores da eleição presidencial de 2022, que culminou no ato de 08 de janeiro, um dos momentos políticos mais tensos do Brasil recente, o filme mergulha nos dois turnos, nos dois lados, nas várias camadas que formam o eleitorado, sem nunca perder o foco na construção narrativa. Não há aqui cortes frenéticos, nem trilhas dramáticas: há pessoas, falas, olhares, esperas, dúvidas e certezas que se chocam. A câmera se aproxima, mas não manipula.
A diretora quase não intervém, e isso é uma escolha a ser observada nos atos lineares. Ao abrir espaço para que os entrevistados falem livremente, o filme constrói um mosaico de ideias, posicionamentos e conflitos, muitas vezes contraditórios, mas necessários para entender o estado emocional e político do país naquele período.
É evidente que há um posicionamento do filme, sim. Mas Kogut se preocupa em mostrar as diferentes vozes, de ambos os lados da disputa, tanto Lula quanto Bolsonaro aparecem por meio de seus apoiadores, estratégias e mudanças de postura entre o primeiro e segundo turnos. A estratégia narrativa de não cortar as falas e deixar que as cenas “respirem” reforça a confiança no que está sendo documentado.
Outro ponto de destaque é como o documentário acompanha não só o fato em si, mas também suas repercussões, o movimento de reação das campanhas, as tensões nos bastidores, os gestos calculados.
O lançamento quase simultâneo com Apocalipse dos Trópicos, na Netflix, parece acidental, mas funciona como um curioso contraponto da mesma história recente do país; Se aquele mergulha num caos quase distópico e performático, este opta por um olhar direto e cru, mais voltado ao realismo documental do processo democrático em disputa.
O filme não traz revelações bombásticas, nem pretende esgotar o assunto. Ele entrega, com sobriedade, um recorte muito preciso e sensível de um Brasil dividido.
Nota: 3/5
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